Quando cheguei ao Digitalks 2024, fui recebida com uma grata surpresa: quem, como eu, tinha a credencial para os dois dias de evento, tinha direito a acompanhar também o Influent Summit, iniciativa com o objetivo de se tornar o maior encontro de Creator Economy da América Latina. Refiz minha agenda e corri para acompanhar os insights das duas frentes. Foi cansativo, mas muito legal! Venho aqui compartilhar algumas reflexões que rolaram por lá.
No geral, quase todas as palestras que acompanhei tangenciaram o tema do desafio da construção de credibilidade e autenticidade de marcas e creators em uma realidade de canais fragmentados e de rápidas transformações. Neste contexto, a IA aparece como uma de várias camadas de complexidade. Bora ver um resumo de como os painéis abordaram esses temas?
Potencializando de dentro para fora – O aumento da oferta de canais digitais foi acompanhado por um fenômeno desafiador para as marcas: a queda sistemática do alcance orgânico das publicações. Se, em 2019, o alcance potencial de um post do Facebook, por exemplo, era 3%, hoje não chega a 1%. Investir em anúncios pagos é uma forma de driblar a baixa entrega, mas nem só de publicidade vive uma narrativa. Precisamos fortalecer o alcance orgânico! É aí que a influência interna entra. De acordo com a hootsuite, estratégias com embaixadores internos (as que posicionam os colaboradores como influenciadores da empresa) têm o potencial de aumentar o alcance potencial de uma marca em até 200%.
Para além da imagem, o impacto pode mover ponteiros em vendas: de acordo com a Hootsuite, 89% das pessoas confiam mais em dicas de amigos ou conhecidos do que em publicidade. Por isso, estratégias com influenciadores internos têm o potencial de aumentar as vendas em até 23%. Tudo lindo, né? Mas é preciso fazer a lição de casa antes! Para um projeto de embaixadores internos dar certo, é preciso estabelecer processos claros, além de ter apoio dos gestores dos colaboradores escolhidos. O painel também reforçou a importância de se estabelecer KPIs logo no start do projeto para avaliar se estamos alcançando os objetivos.
Inteligência Artificial na Influência – Novas redes (e novos algoritmos!) surgindo ano após ano, trends virais aparecendo uma atrás da outra e competição pela atenção das marcas crescendo exponencialmente: esse é o cenário complexo atual do creator. Não é de se admirar que muitos deles tenham começado a usar IA para dar um help na produção de conteúdo. Essa ajuda pode, de fato, ajudar o criador a delegar tarefas mais operacionais, como legendagem ou edição simples de conteúdo, e focar em coisas mais estratégicas, como curadoria de conteúdo e gestão de comunidade. Mas há uma linha tênue entre a ajuda da tecnologia e a perda de autenticidade, que é o principal asset do influenciador.
Em uma equação complexa como essa, a resolução está no equilíbrio. O influenciador sabe o que funciona bem para sua comunidade, o que o público quer consumir. Mesmo que seja difícil, é importante não ceder à ansiedade de entrar em todas as trends. É melhor sacrificar a quantidade para dar espaço para a qualidade, produzindo apenas o que realmente faz sentido. E, é claro, com empurrãozinho da IA, com moderação!
Por mais que esse papo tenha sido focado em influenciadores, pensei que ela traz dois aprendizados para nós, que trabalhamos com marcas: na hora de escolher o influenciador correto, não basta mais olhar somente para o feat entre a narrativa da companhia e a do criador, mas também entender se ele está colocando a autenticidade no centro da sua produção de conteúdo. Pode ser que isso mude no futuro, mas hoje conteúdo pasteurizado por IA não funciona. O segundo aprendizado é que a máxima de ser fiel ao que funciona para a sua comunidade funciona também para conteúdo de empresas. Vale mais deixar aquela trend passar do que investir tempo e energia em algo que não faz sentido para nosso público.
VUCA (Volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity) x BANI (Brittle, Anxious, Non-linear, Incomprehensible) – Essa foi, na minha opinião, uma das melhores trocas do evento. No painel “Guerra de Conteúdo: Fortalecendo o Pertencimento da Comunidade através de Novos Formatos “, Inaiara Florêncio já começou com a provocação – “Como produzir conteúdo em um contexto de desatenção e hipercompetitividade?”. Confesso que essa pergunta paira na cabeça de todos nós que trabalhamos com conteúdo. Segundo ela, um erro é achar que ainda vivemos em um mundo VUCA, sendo que agora estamos em um cenário de BANI – a ambiguidade dá espaço ao incompreensível, enquanto a complexidade ao não-linear. O tempo e os canais estão muito mais quebradiços, tudo é muito mais difícil de prever ou entender, no geral. Se, hoje, o brasileiro passa em média 9 horas dividindo a atenção entre diferentes redes sociais, isso quer dizer que ele passa mais da metade do tempo que está acordado nesses canais. Estamos saturados de conteúdo e com uma jornada de consumo extremamente fragmentada.
Para se destacar, é preciso criar pertencimento. E, para isso, é fundamental investir nas conexões, olhando com carinho para os nichos e comunidades, tomando o cuidado de não generalizar na produção de conteúdo. A massificação, que já vinha perdendo espaço há muitos anos, morre de vez. É preciso entender em nível granular o que o público quer consumir e focar em clusters reduzidos para ser mais assertivo. Para fechar esse item, deixo vocês com a frase da painelista, que amei – “Se antes, o conteúdo era rei, agora a comunidade é a rainha”.
Conquiste primeiro, venda depois – Confesso que gostei muito de ver, em várias palestras, o debate sobre a vocação da influência. Já falei aqui no blog sobre o erro comum de considerar criadores de conteúdo espaço publicitário a ser comprado. Eles são parceiros para a construção de narrativas que engajam, aproximam e, sim, ajudam a vender produtos e serviços. Mas eles não são marketplaces. Eles são aliados no processo de conquista do público. E, de acordo com diversos palestrantes do evento, é preciso “conquistar primeiro e vender depois”.
E, para conquistar o público de verdade, é preciso que o conteúdo do creator traga verdade, sem ter “cara de publi”. Isso é possível quando há uma verdadeira conexão entre o influenciador e a marca. Só assim o produto é adicionado de uma forma fluída na narrativa do criador de conteúdo, o que estimula o engajamento (e a conquista!) da comunidade.
Muitas páginas de caderno preenchidas depois, saí do Digitalks com a cabeça fervilhando de ideias e muito feliz por participar, mais uma vez, do megaevento. Resumir os insights foi um desafio. Mas espero que gostem! 😊
Pamela Carvalho, head de estratégias digitais e conteúdo da Textual